Política

Deus, vitória e tiros nos pés: os políticos foram aos fogos

O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, em Monchique Foto Lusa

O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, em Monchique Foto Lusa

Neste fim de semana, o poder foi a Monchique tentar apagar o que restava do maior incêndio, deste ano, no país e na Europa. Marcelo recusou “triunfalismos” e entregou-se a Deus. Costa prometeu um novo programa de apoio. O ministro falou em “grande vitória” e teve de emendar a mão, porque se esqueceu... dos bombeiros

Texto Rosa Pedroso Lima

Mal o fogo de Monchique foi dado como controlado, os políticos trataram de fazer o rescaldo de uma semana que todos assumem ter sido “difícil” e uma “batalha” que está longe de estar extinta. Primeiro, foi o ministro da Administração Interna a visitar as áreas ardidas da serra algarvia e entusiasmou-se com “a grande vitória” de ter sido possível apagar as chamas sem nenhuma vítima mortal.

Eduardo Cabrita dava o primeiro tiro no pé, que teria de ser, horas mais tarde, corrigido pelo primeiro-ministro que, no mesmo local, sublinhava que o “importante era evitar vítimas mortais”. “Desse ponto de vista, o que todos temos a registar de positivo é que felizmente não houve nenhuma situação de perda de vida, nem um único ferido grave”, disse.

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Marcelo foi o último a chegar. No sábado, depois de inéditos cinco dias de silêncio, o Presidente da República fez questão de marcar presença no seu habitual roteiro de afetos para dar “consolo” à população e ouvir queixas, críticas e lamentos.

Mas não só: Marcelo fez questão de deixar alguns recados políticos, mais ou menos diretos. O primeiro foi feito “humildemente” e pedia para que as análises do ocorrido em sete dias de incêndio fossem feitas “sem triunfalismos, que não se justificam”. Se a carapuça servia ao ministro da Administração Interna não foi expresso, mas talvez não fosse necessário.

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O segundo recado foi no sentido da criação de uma comissão permanente, junto do Parlamento, que analisasse o modo como é feito o combate aos incêndios. Dez dias depois de ter promulgado um diploma para criação de um Observatório Técnico Independente para os fogos (ver texto mais à frente, na zona País), o Presidente não resistiu à tentação legislativa e sugere que se dê 'musculo' e poder de intervenção a uma entidade capaz de, mais do que observar e recolher informação, ter capacidade de avaliar de forma consistente os erros e virtudes do modelo de combate aos fogos.

No terreno, o Presidente também não conseguiu fugir às perguntas dos jornalistas sobre se uma eventual recandidatura a Belém estaria posta em causa com um novo ano mau no combate aos fogos. Em maio, Marcelo tinha dito que se “voltasse a correr mal, o que correu mal no ano passado” fecharia a porta a um novo mandato presidencial. Em Monchique, manteve o suspense político. “Está nas mãos de Deus essa decisão”, disse o chefe do Estado.

Bombeiro não entra

A passagem da comitiva de políticos pelo Algarve acabou por dar azo a uma série de críticas. E não foi só a população a aproveitar a presença de Costa e Marcelo como muro de lamentações.

No sábado, depois da passagem das principais figuras do Estado pela região dos fogos, a Liga dos Bombeiros Portugueses questionou oficialmente o ministro da Administração Interna sobre os motivos que levaram à exclusão dos bombeiros das formaturas oficiais de receção aos chefes do Estado e do Governo.

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A receber o primeiro ministro e o Presidente da República estiveram, alinhados, os elementos da força especial da GNR para combate aos incêndios, assim como quadros da Proteção Civil. “É inadmissível, é inaceitáel que só participem forças que são minoritárias no terreno”, disse à Lusa o presidente da Liga, Jaime Marta Soares.

O embaraço, ou tiro no pé, foi evidente. E, na verdade, este domingo o Ministério da Administração Interna emendou a mão com um comunicado enviado para todas as redações e colocado on line na página oficial do Governo.

“O ministro da Administração Interna saúda todos os corpos de bombeiros, de norte a sul do país, que participaram no combate ao incêndio de Monchique”, escreve a nota de Eduardo Cabrita. “Tal como foi afirmado, os bombeiros são 'a coluna vertebral' do sistema de Proteção Civil em Portugal” e são “um exemplo para o país que o ministro da Administração Interna, em nome dos portugueses”, agradece. Mais vale tarde do que nunca.