POLÉMICA CGD
Mário Centeno assume “erro de perceção” em acordo com Domingues
FOTO LUÍS BARRA
Ministro das Finanças pôs o lugar à disposição de António Costa. Mário Centeno convocou conferência de imprensa esta segunda-feira para responder à polémica da CGD e ao acordo que fez com Domingues
TEXTO ADRIANO NOBRE e HELENA PEREIRA
O ministro das Finanças afirmou esta segunda-feira em conferência de imprensa que houve “um erro de perceção” no acordo que fez com António Domingues para a presidência da Caixa Geral de Depósitos, garantindo que houve acordo apenas sobre o salário do gestor mas não sobre isenção de apresentação de declaração de rendimentos ao Tribunal Constitucional. E anunciou que pôs o lugar à disposição do primeiro-ministro: “Reiterei que o meu lugar está à disposição desde o dia em que assumi funções”.
A conferência de imprensa foi convocada para o fim da tarde pelo Ministério das Finanças, isto no dia em que o primeiro-ministro voltou a comentar o caso da CGD depois da última acusação de Marques Mendes, que afirmou na SIC que o Governo reteve durante um mês a publicação em “Diário da República” do estatuto do gestor público para evitar que os deputados pedissem a sua apreciação parlamentar.
“Espírito criativo de ficção policial”, garante o primeiro-ministro, António Costa. “Uma interpretação muito própria de um agente político com vestes de comentador”, acrescenta o deputado Eurico Brilhante Dias. Foi desta forma que Governo e PS reagiram à mais recente polémica em torno da anterior administração da CGD e da gestão feita pelo Governo ao processo de negociação em torno do decreto que alterou o estatuto do gestor público e que previa a isenção, por parte dos administradores do banco público, de entregarem as suas declarações de rendimentos e património no Tribunal Constitucional.
FOTO ALBERTO FRIAS
No seu comentário de domingo, na SIC, Marques Mendes recordou que depois de ter sido aprovado em Conselho de Ministros e promulgado pelo Presidente da República a 21 de junho, a publicação do decreto em Diário da República aconteceu mais de um mês depois, a 28 de julho. Uma situação que, argumentou o comentador, terá resultado da intenção do Governo de fazer coincidir a publicação da nova lei com a entrada em férias dos deputados. “Deste modo não se aperceberiam do decreto-lei e não podiam pedir a sua análise no Parlamento”, defendeu Marques Mendes, acusando o Governo de “manipulação” na divulgação do diploma.
FOTO ALBERTO FRIAS
A tese do comentador foi, no entanto, desmontada esta segunda-feira pelo primeiro-ministro, considerando que as palavras de Mendes “não fazem o menor sentido”. “É um espírito criativo de ficção policial, mas não teve nada que ver com a realidade da vida política. Não é assim que os órgãos de soberania se relacionam uns com os outros”, resumiu Costa, citado pela Agência Lusa, à margem da sua visita aos militares portugueses na República Centro-Africana.
Na origem do atraso, segundo as explicações dadas pelo primeiro-ministro à Lusa, terá estado o facto de o Governo ainda se encontrar, na altura, “em plena fase de conclusão das negociações com a Comissão Europeia sobre o processo de recapitalização”. “Havia várias parcelas, uma tinha que ver com o estatuto do gestor público, outra com a possibilidade de capitalização. Em julho chegámos a uma fase decisiva em que houve acordo quanto ao desenho do sistema”, resumiu Costa, garantindo que “seria completamente absurda qualquer tentativa de esconder o que é óbvio, visto que as leis são publicadas em Diário da República e poderia sempre haver apreciação parlamentar, aliás, como houve”.
Minutos antes de serem conhecidas as explicações de António Costa, o deputado socialista Eurico Brilhante Dias já defendia, em declarações ao Expresso, que as acusações de Marques Mendes configuravam “uma interpretação muito própria da realidade”. “Faz parte do jogo político em que o dr. Marques Mendes é ator. É um agente político com vestes de comentador, que traz parte da agenda do PSD e do CDS para a mesa aos domingos”, acusou o deputado socialista, lamentando que o debate em torno da CGD já não seja “sobre factos, mas sobre política” e que não esteja a acrescentar “nada de novo” ao que antes se sabia.
FOTO GONÇALO ROSA DA SILVA
“Excetuar a administração da CGD das obrigações do estatuto de gestor público era um elemento que o Governo considerava importante para o processo de recapitalização da CGD. E fê-lo no quadro das suas competências. Mas essas competências não se sobrepõem às da Assembleia da República. E a Assembleia da República alterou esse decreto. Ponto”, recapitula Brilhante Dias, recordando que “não só o Tribunal Constitucional e o Presidente da República mas também o grupo parlamentar do PS” tiveram a mesma interpretação sobre o facto de os gestores da CGD não poderem ser isentados da apresentação destas declarações.
E não está o Ministro das Finanças fragilizado pelas crescentes suspeitas em torno do que terá ou não garantido ao ex-presidente da CGD sobre essas isenções? “O senhor ministro foi acusado de mentir, mas isso está por provar”, insistiu Brilhante Dias.
Uma prova que os deputados do PSD e do CDS poderão voltar a tentar fazer esta quarta-feira de manhã, quando Mário Centeno regressar à comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa para uma audição parlamentar que tem como ponto de ordem “debater a política geral do Ministério e outros assuntos de atualidade”. E se há assunto que insiste em não sair da atualidade é nomeação e destituição da anterior administração da CGD.