Análise

NATO. Choque e pavor

O Presidente americano Donald Trump Foto Yves Herman/REUTERS

O Presidente americano Donald Trump Foto Yves Herman/REUTERS

O Presidente americano usa em política uma técnica de guerra. E, no fim, vence e deixa os aliados desorientados

Texto Luísa Meireles

O primeiro-ministro António Costa admitiu publicamente que a última reunião da NATO não foi “tão horrível” como a do Conselho Europeu a que compareceu há 15 dias, mas confessou que foi tensa e recusou-se a “comentar pormenores”, desvalorizando o “estilo negocial” de cada um.

Na manhã desta quarta-feira, Donald Trump começou subitamente a discutir as questões dos aumentos da despesa militar (que no mesmo dia tinha sugerido que fossem elevada, não para 2% do PIB mas para 4%) na presença dos presidentes georgiano e ucraniano, que também se deslocaram à cimeira para as suas reuniões de parceria.

A reunião foi então interrompida, os dois parceiros convidados a sair e fez-se nova reunião, mas no chamado “formato 1”, que em linguagem NATO quer dizer apenas um representante de cada país. Era a tal “reunião de emergência” que a comunicação social noticiou logo pela manhã.

O ponto de Trump foi: ou há aumento de despesa da parte dos restantes países da NATO, ou os EUA “podem seguir o seu caminho”. Se os representantes de uns países viram nisto uma clara ameaça, outros consideraram que não.

Seja como for, a verdade é que Trump nunca conseguiria pôr o seu país fora da Aliança Atlântica sem o apoio do Congresso. E não é de todo certo que tal acontecesse.

Por outro lado, é certo que os aliados europeus desta vez vão mesmo cumprir com a promessa que andam a arrastar há anos de aumento das despesas militares. Incluindo Portugal, que apresentou o seu próprio plano de aumento de despesas.

Foto CHRISTIAN BRUNA/EPA

Foto CHRISTIAN BRUNA/EPA

Um estilo particular

É este o estilo de Trump: choque e pavor. Hábil negociante, usa em política as mesmas técnicas da guerra e estas resultam. Antes da cimeira, fez-se preceder por uma série de tweets ( https://twitter.com/realDonaldTrump/status/1016616792926703616 ), em que criticou fortemente os aliados e visou particularmente a Alemanha. Em causa, o excedente comercial desta em relação aos EUA. Chegou para desorientar os aliados, preparando-os para o pior, ao ponto de estes esperarem tudo desta cimeira, incluindo que ela resultasse em nada.

No fim, o Presidente americano obteve ganho de causa. Os aliados vão aumentar as despesas militares. A meta dos 2% fixada na cimeira de Gales, há quatro anos, ficou assim escrita na pedra. Em boa verdade, nenhum outro Presidente americano o conseguiu, apesar de alertarem há muito para o peso excessivo da “quota” dos EUA na NATO.

Presidente Donald Trump abandona a conferência de imprensa, na manhã de quarta-feira, na NATO Foto CHRISTIAN BRUNAEPA

Presidente Donald Trump abandona a conferência de imprensa, na manhã de quarta-feira, na NATO Foto CHRISTIAN BRUNAEPA

O seu último tweet da manhã de quarta-feira sobre a NATO foi, aliás, a insistir na necessidade dos aliados cumprirem a meta dos 2%: “Todas as nações da NATO têm de cumprir o compromisso de 2%, e têm obrigatoriamente de alcançar os 4%.”

Política sempre

Enquanto negociava com os aliados em termos a que estes estão pouco habituados, Trump ia fazendo tweets dirigidos aos agricultores americanos AQUI, que empobreceram devido ao desequilíbrio comercial.

Ninguém duvida que os seus tweets sobre a estratégia relativamente à NATO têm também um alcance interno, dirigidos ao seu eleitorado. “America first” sempre! Apelidado por muitos de “ignorante”, Trump é um político que aplica com sucesso as técnicas comerciais à política. E resulta. Na Europa, a imprevisibilidade de Trump desorienta mas, nos Estados Unidos, alimenta a popularidade junto do seu eleitorado.

Trump já desembarcou entretanto em Londres para uma visita de dois dias. Depois de um fim de semana privado com Melania na Escócia, onde tem empreendimentos de golfe, encontrar-se-á com Vladimir Putin em Helsínquia.

O grande receio que deixou em Bruxelas é que tipo de cimeira terá ele com o líder russo e se fará algum tipo de compromisso.

Trump ainda não se pronunciou sobre o assunto. Mas já retweetou na frente interna, apenas duas horas depois de ter aterrado em Londres: “Trump é o presidente mais consequente da história quando se trata do emprego das minorias. Em junho, por exemplo, o desemprego dos hispânicos e latinos acima dos 16 anos caiu para 4,6%, a taxa mais baixa de sempre, de 4,9% em maio.”