Chamem-me o que quiserem
Henrique Monteirohmonteiro@expresso.impresa.pt
Indignações panamianas e as suas tristezas
Eu fico sinceramente indignado (em certos casos) ou triste (noutros) com os casos de pessoas que têm dinheiro nos offshores, nomeadamente neste caso dos Panama Papers. Fico indignado com um primeiro-ministro da Islândia (que ainda há pouco sofreu uma crise brutal) ou com as mentiras que se vão descobrindo no que toca ao GES (ou seja, aos donos do que foi o BES). E triste quando esses casos tocam pessoas que tenho por sérias, como o caso de Luís Portela, dono da Bial, ou, noutro plano, Vargas Llosa, um dos meus escritores preferidos.
A indignação leva-nos a escrever coisas mais ou menos definitivas sobre a atividade dos offshore. Mas a tristeza conduz-nos a outro destino: e se fosse eu a ter aquele dinheiro e a ter de pagar aqueles impostos, faria também uma finta (ainda que legal) à Autoridade Tributária?
Convenço-me de que não a faria. Já passei por situações em que fui aconselhado por advogados a ter, digamos, agressividade fiscal e recusei. Só que os valores em causa eram, comparados com os que estamos a ver, insignificantes. Foi Pitigrilli, pseudónimo do jornalista e escritor italiano Dino Segre (1893-1975), quem terá dito que toda a consciência tem o seu ponto de fusão. Talvez seja verdade. Talvez a minha fusão se desse lá para os milhões de euros. Quem sabe? Quem pode jurar que a sua nunca fundiria?
Há que ser sério na apreciação destas matérias. E penso que, felizmente, o consórcio e os jornalistas e órgãos de comunicação social portugueses envolvidos estão a sê-lo. A turba quer sangue, quer nomes, independentemente de as situações serem ou não legais, porque não querem dar-se ao trabalho de separar o trigo do joio. Querem esses nomes com provas ou sem provas, com confirmações ou sem elas. E, no entanto, a turba é a mesma (incluindo seguramente cada um de nós, do que escreve ao que lê) a mesma que está fartinha de pagar pequenos arranjos sem faturas, de ir a restaurantes onde é mais barato caso não se pague com multibanco e outras pequenas maroscas próprias de quem não tem dinheiro para colocar em lado nenhum, quanto mais em offshores.
O caso não é de adultério, mas está ao nível do “quem nunca pecou que atire a primeira pedra”. E a primeira pedra é fácil de atirar à cabeça de quem faz tráfico de droga ou de pessoas; de quem vende armas ou marfim, ou de quem tem qualquer negócio menos claro e esconde o dinheiro da vista dos outros. Mas começa a ser mais difícil quando se pensa: eu ganhei um prémio e vão sacar-me metade em impostos. Ou eu herdei uma casa e se a vender pago milhares de euros em IRS. Ou, como se lê hoje no ‘Público’, quando os próprios rendimentos de trabalho (salários) foram em Portugal os que tiveram maior aumento da carga fiscal em toda a OCDE.
Há outro motivo de indignação no caso dos Panama Papers, do meu modesto ponto de vista. Chama-se carga fiscal. Talvez o Estado não possa viver com menos, mas também não é sério sacar tanto a quem o ganha honestamente. Talvez por isso, ao contrário do que talvez ingenuamente pensava, não se vejam só nomes de facínoras nas intermináveis listas a que os jornalistas tiveram acesso.
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Amanhã
CINEMA
PARA PERCEBER AMADEO
Na Fundação Calouste Gulbenkian há esta quarta-feira, 13, a antestreia do filme “Amadeo de Souza Cardoso: o último segredo da arte moderna”, de Christophe Fonseca. Esta é uma coprodução internacional realizada no âmbito da exposição que o Grand Palais, em Paris, vai dedicar ao artista português a partir de 20 de abril. A sessão tem início as 18h30 e a entrada é livre.
TEATRO
REGRAS SOCIAIS
A Companhia Palco13 estreia “Tudo Bem?”, de Jean-Claude Grumberg, esta quarta-feira, no Auditório Fernando Lopes Graça, no Parque Palmela, em Cascais. Com encenação de Maria Camões, o espetáculo fica em cartaz até 23 de abril, de quarta a sábado, às 21h30. O bilhete custa €10.
EXPOSIÇÃO
PARA VER E OUVIR
O Prémio Estação Imagem chega à sua 7.ª edição esta quarta-feira. Exposições, documentários e mercado do livro de fotografia são as atividades que compõem a iniciativa, que é inaugurada às 18h, no Teatro Municipal Sá de Miranda, em Viana do Castelo. A entrada é gratuita e a programação prolonga-se até 17 de abril.
MÚSICA
RITMOS DIVERSOS
A banda Stereotipos, formada por Pedro Frazão e Jorge Machado, leva ao palco do Teatro Municipal Pax Julia, em Beja, sonoridades do pop rock ao funk e ao reggae. Esta quarta-feira, a partir das 21h30, com o ingresso a €2.