Turismo
“A Turquia está a €300 e o Algarve a €1500”: turismo em Portugal arrefece e depois há um problema chamado “aeroporto”
Turquia está a abrandar o crescimento turístico de Portugal
Texto Conceição Antunes
O turismo em Portugal continua a crescer em 2018 mas já não ao mesmo ritmo do ano passado. O regresso da Turquia e outros destinos afetados pela Primavera Árabe está a fazer mossa no Algarve e na Madeira, sobretudo ao nível de ingleses e de alemães, mas no geral as quebras têm vindo a ser compensadas pelo aumento de turistas de outras origens, como brasileiros, americanos ou franceses, o que é visível nas diversas regiões do país. No acumulado do ano e até ao início de maio, o aumento médio de dormidas no país não foi além de 1,6%, evidenciando-se quebras homólogas na casa dos 2% no Algarve e na Madeira, que estão entre as principais regiões turísticas.
No Algarve, o principal destino turístico nacional, o primeiro semestre trouxe “uma ligeira quebra em relação ao ano passado, mas este ano tem sido atípico a nível de temperaturas e a Páscoa também foi muito cedo”, constata Desidério Silva, presidente da Região de Turismo do Algarve. “Penso que em 2018 as coisas ainda podem compor-se, mas não atingirão os números de 2017.” Lembra que no ano passado o Algarve recebeu “5 milhões a 6 milhões de turistas, totalizando 20 milhões de dormidas oficiais, além de 10 milhões não oficiais, que não contam para as estatísticas mas contam para a economia local”.
Os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) dão conta de uma quebra no Algarve de 2,2% em dormidas nos primeiros quatro meses face ao período homólogo do ano passado, para um total de 3,75 milhões. Segundo a associação de hotéis e empreendimentos do Algarve (AHETA), no mês de junho verificou-se uma descida média de 4,5% nas taxas de ocupação, que no acumulado do ano se cifra em 2,1%. Mas apesar da quebra na ocupação, o que a AHETA também apurou é que os hotéis da região tiveram uma subida de receitas de 3,7% no primeiro semestre relativamente ao ano passado, num sinal claro de “melhoria dos preços”.
O principal motivo para o arrefecimento da chegada de turistas ao Algarve está a vir da concorrência de “países como a Turquia, a Tunísia ou o Egito, e o que mais assusta é a baixa de preços que estão a fazer para recuperar os turistas que perderam nos últimos anos”, destaca Desidério Silva. “E nós no Algarve não conseguimos - nem queremos - baixar os preços a estes níveis para sermos competitivos com eles.”
O presidente da Região de Turismo do Algarve defende que é preciso por parte do Governo uma “intervenção de fundo nos mercados emissores de turistas a promover o Algarve e a mostrar às pessoas as diferenças do nosso destino, que continua a ser de referência. Isto tem de ser resolvido na origem”.
“Tem de ser uma ação muito forte, porque estamos a lidar com concorrentes muito fortes. Basta ir a qualquer cidade europeia para ver cartazes desses países por todo o lado”, frisa o responsável, sustentando que Portugal devia fazer o mesmo. “Temos uma imagem positiva, somos o melhor destino da Europa e do mundo, temos serviço e qualidade. Mas o que se passa hoje é que um inglês ou um alemão, ao ir a uma agência de viagens, tem pacotes de uma semana a €300 para a Turquia e para o Algarve a €1500”. Além da Turquia, a concorrência também vem da Tunísia ou do Egito. “São países que quase estão a oferecer os voos e a estadia aos turistas. A Turquia põe os aviões no ar com o Governo a pagar os combustíveis”, exemplifica.
Desidério Silva frisa que mais do que o efeito do Brexit ou da desvalorização da libra, é o regresso dos destinos abalados pela Primavera Árabe que mais está a contribuir para a queda de ingleses no Algarve (de 11,2% em junho) e também de alemães (que caíram 19,7% no mês passado). “O Governo tem de estar atento e atacar estes problemas na origem. É algo que para uma região de turismo é difícil de fazer”, sustenta, considerando não ser suficiente a campanha de €1 milhão anunciada pelo Governo para este efeito e com vista a incentivar os operadores turísticos no Algarve e na Madeira no período inverno.
Para o Algarve, em termos globais o balanço do semestre não foi eufórico - e o tempo também não tem ajudado. “Há hotéis que se queixam de quebras de 10%. Em termos globais, a economia não produziu o que se esperava”, refere o presidente da região turística, que além dos hotéis também enfatiza o negócio dos cafés, bares e restaurantes. “Com o clima que tem estado, os frios e os ventos de norte, as esplanadas praticamente não têm funcionado. Os empresários do Algarve queixam-se muito e com quebras à volta dos 20%.”
Mas se o clima ajudar e a temporada de verão se estender, “pode vir a recuperar-se até ao final do ano”. “O que se nota é que há cada vez mais viagens para a região mas as pessoas ficam menos tempo. Isto tem que ver com outra forma de fazer turismo, em que as pessoas têm acesso ao estado do clima por telemóvel.” Lembrando que “não podemos ter todos os anos subidas de 20%, sobretudo quando partimos de uma base grande”, o presidente da Região de Turismo do Algarve avança que “ficaria feliz se acabássemos o ano com valores próximos dos do ano passado, não sendo expectável que estes venham a ser ultrapassados”.
Também a Madeira se está a ressentir do desvio de turistas com o regresso ao mercado de países que estiveram anos congelados por terem sofrido turbulências políticas ou mesmo atentados terroristas. A quebra de turistas na Madeira cifrou-se em 2,3% no acumulado do ano e até ao início de maio. Foi também a região onde se verificou a maior redução da estada média dos turistas - caiu 7,6% - mas que ainda assim é a mais elevada a nível nacional (4,62 noites).
Já em destinos nacionais de menor volume, como Açores, Alentejo ou região Centro, não se sentem os efeitos diretos do regresso da Turquia como na Madeira e no Algarve, que são mais destinos-resort, e as perspetivas em 2018 continuam a ser de crescimento. Nos Açores, o volume de dormidas subiu 4,1% nos primeiros quatro meses, no Alentejo 4,8%, na zona Centro 2,5% e na região Porto e norte de Portugal 6,9%.
Lisboa só não cresce mais por causa do aeroporto
Na região de Lisboa, a perspetiva para 2018 é que “vai haver um aumento de turistas”. Ainda assim, “não será um ano de crescimento excecional, mas nos próximos tempos também não podemos esperar aumentos tão significativos como os que tivemos nos últimos anos, até porque há limitações no aeroporto”, salienta Vítor Costa, presidente da Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa e diretor-geral da Associação Turismo de Lisboa.
No acumulado do ano até ao final de junho, as taxas de ocupação dos hotéis foram de 78% na cidade de Lisboa e de 75% em toda a região envolvente, em linha com os resultados do ano passado e com alguns aumentos marginais. Só no mês de junho os hotéis de Lisboa estiveram cheios a 88%, “o que já é uma taxa muito elevada”, frisa o responsável.
Mas a maior subida tem vindo do lado das receitas, e até final de junho o rendimento por quarto disponível (indicador RevPar) registou em Lisboa um significativo aumento de 12%, segundo dados do observatório de turismo ainda não definitivos.
“O aumento quantitativo de turistas não tem sido grande, o que tem crescido mais são os preços, o que tem permitido uma maior rentabilização”, refere Vítor Costa.
“Em Lisboa não temos sentido as questões associadas à recuperação da Turquia e dos países do norte de África, isso não nos afeta muito“, adianta o presidente da Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa. “Temos sentido, isso sim, a quebra do mercado inglês. Mas temos um portefólio muito diversificado de turistas, e têm crescido muito os brasileiros, americanos ou franceses”.
O problema em Lisboa é mesmo o aeroporto da Portela e as indefinições face ao Montijo. “Não vamos poder crescer muito em turistas por causa do aeroporto. Enquanto conseguirmos compensar estas limitações com o aumento de preços é menos mau”, diz Vítor Costa, frisando tratar-se de “uma situação preocupante” para Lisboa. “Quando é que o Montijo vai estar pronto? E, até lá, quando avançam as medidas intercalares? Verificamos que há um impasse e uma aparente descida de qualidade e há pouco tempo o El País trazia um artigo sobre o caos no aeroporto de Lisboa”, salienta o responsável do Turismo de Lisboa, frisando ser este o principal problema e que traz as maiores incógnitas relativamente ao turismo na região.