Daesh

“O pai está para te ir buscar”: o texto de Luís, que há quatro anos perdeu a filha para a Jihad

Ângela Barreto viajou para a Síria em agosto de 2014, à revelia da família, para se casar com Fábio Poças FOTO D.R.

Ângela Barreto viajou para a Síria em agosto de 2014, à revelia da família, para se casar com Fábio Poças FOTO D.R.

Agosto é o mês em que a família celebra o aniversário da jovem Ângela Barreto. Mas também é o mês em que chora a sua partida para a Síria, faz esta sexta-feira quatro anos. O pai decidiu publicar no Facebook uma mensagem de parabéns à filha, quatro anos depois daquela viagem ainda sem regresso

Texto Hugo Franco

Luís é mais um pai derrotado pelo terrorismo. Há quatro anos que é consumido pela esperança de voltar a ver a filha que fugiu de casa aos 19 anos, pelo desespero de perceber que a qualquer minuto pode receber a pior das notícias, ou até pelo conformismo de quem acaba por aceitar uma realidade que é para lá de adversa.

Agosto é um mês especialmente difícil para a família, que se divide entre o Alto Alentejo e o centro da Holanda. Dia 2 é o do aniversário de Ângela Sofia Barreto. Dia 9 o da fuga da jovem para a Síria, quando decidiu juntar-se, à revelia dos pais, ao grupo terrorista autodenominado Estado islâmico (Daesh).

Quatro anos depois, o pai decidiu publicar na sua página do Facebook uma mensagem de parabéns à filha que perdeu para a Jihad.

“Estejas onde estiveres, hoje é o teu dia de aniversário. Tomaste as tuas decisões, para mim erradas, mas é a lei da vida. Fizeste a cama onde te deitaste. Tinhas tudo o que querias, nada podemos fazer para que voltes. Só tu podes decidir quando chegar esse dia. Só tens que dizer. O Pai está para te ir buscar. Mas não são só estes dias que deixas saudade. Feliz Aniversário, Ângela Sofia.”

A mensagem vem acompanhada com uma foto da jiadista quando era apenas uma criança.

Um regresso incerto

Ângela Barreto foi ter com o jiadista Fábio Poças — ou Abdurahman al Andalus — à Síria em agosto de 2014. Os dois jovens nunca se tinham visto antes. O namoro e o noivado fizeram-se online, nas redes sociais. Em comum descobriram o radicalismo islâmico, a oposição ao Ocidente e a nacionalidade portuguesa. Tal como Fábio, que cresceu nos arredores de Lisboa, também Ângela é a única muçulmana da família e converteu-se em tempo recorde, influenciada pelos amigos e pela internet.

A luso-holandesa teve duas crianças já enquanto se encontrava na Síria

A luso-holandesa teve duas crianças já enquanto se encontrava na Síria

A 9 de agosto, aproveitou a ausência da mãe, com quem vivia nos arredores de Utreque, e fugiu de avião, numa viagem sem bilhete de regresso. Dias depois a luso-holandesa estava casada com o jiadista português, no coração do autodenominado califado.

O casal teve dois filhos. Em 2016, Ângela Barreto deu à luz uma menina, num parto feito por cesariana num hospital de Raqqa, na Síria. Apesar de um dos primeiros nomes da bebé ser tipicamente português, o casal optou por lhe dar o apelido Andalus, o mesmo que é usado por Ângela e Fábio e pela maioria dos cidadãos portugueses que combatem no Daesh. Quanto à segunda criança, nasceu há poucos meses, também na Síria.

Pouco ou nada se sabe sobre onde Ângela e Fábio se encontram atualmente. Presume-se que algures em territórios dominados pelo Daesh. Presume-se que ainda vivos. Há pelo menos dois anos, os dois são alvo de um mandado de captura internacional, emitidos por Lisboa e por Amesterdão. Se voltarem para a Europa serão certamente detidos. Fica por saber o que acontecerá aos dois filhos, bem como às mais de vinte crianças com sangue português que se encontram nas mãos do Estado Islâmico. O futuro que têm pela frente é mais do que incerto.