Henrique Monteiro

Chamem-me o que quiserem

Henrique Monteiro

Um dilema chamado Rui Rio

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Subitamente neste verão, variação do célebre título ‘Subitamente no Verão Passado’, peça de Tennessee Williams adaptada ao cinema com guião de Gore Vidal, neste verão, pois, começou-se a colocar em causa Rui Rio, oito meses depois da sua eleição. E as críticas que lhe fazem, desde as implícitas de Santana Lopes, às explícitas de Pedro Duarte ou Luís Montenegro, contêm em si um dilema difícil de resolver.

Os críticos podem ter razão política, sobretudo se entendermos a política como algo de imediato. Na verdade, Rio cala-se quando devia falar (felizmente não é tanto de falar quando não deve). Questões como o descontrolo que por aí se vê nos fogos, ou o descalabro da CP, ou a situação dos hospitais, embora aqui e ali abordadas pelo líder do PSD, não o são com a combatividade requerida por quem está na Oposição. Esta é uma parte do dilema que daria razão aos críticos.

Porém, quando exigem que Rio se pronuncie sobre o Orçamento sem o conhecer, ou que faça oposição com críticas a aspetos em que não faria melhor (se outros motivos não houvesse, haveria a falta de dinheiro), pretende-se que a demagogia faça parte do discurso do líder do PSD, algo que me parece que ele tenta fugir. O problema é que esta nova maneira de estar na política – que lhe rendeu indubitáveis vitórias na cidade do Porto – pode não ser transponível para o conjunto do país, sobretudo no espaço temporal em que tem de movimentar-se, com eleições europeias e legislativas à vista e um PS que está, nas sondagens, claramente distanciado e consegue fazer uma gestão da comunicação 100 vezes melhor do que a do PSD.

Sinceramente, o que para muitos pode ser uma opção evidente, torna-se para mim um dilema. Será melhor persistir na recusa de qualquer demagogia, de qualquer promessa falsa, de qualquer ataque sem estrutura? Ou, pelo contrário, um líder da Oposição tem por dever combater por todos os meios o Governo e tentar substituí-lo, estando para isso convencido de que faria melhor? Não creio que Rio tenha respondido claramente a nenhuma destas perguntas e isso está a exasperar parte do PSD.

Percebo que Santana Lopes se sinta no partido errado, mas já não entendo que a sua via seja o antieuropeísmo e a canga populista em voga na Europa

De qualquer modo, tudo o que tem a ver com a recusa da demagogia e do populismo parece-me bem. Percebo que Santana Lopes se sinta no partido errado, mas já não entendo que a sua via seja o antieuropeísmo e a canga populista em voga na Europa. Também compreendo que pessoas mais ligadas a Passos Coelho se irritem por Rio parecer não contar, ou mesmo renegar, o legado do anterior líder. Talvez seja essa a pior coisa que faz. Porque, se formos ver com alguma calma, a ação deste Governo, apesar da sua popularidade e do clima de otimismo e confiança que provocou, é, em si mesmo, uma homenagem aos esforços do Governo anterior.

Para o demonstrar sem grande esforço basta ver que, para repor salários e pensões (de molde a que agradou, mas não entusiasmou os beneficiados), mantendo os compromissos europeus sobre a trajetória da dívida, o Governo do PS deixou degradar inúmeros serviços públicos. O que seria dos grandes defensores do SNS ao verem o que se passa hoje, caso o Governo fosse de direita? Ou o que se passa na Educação? Ou no aeroporto? Ou na CP? Ou nas Forças Armadas e a trapalhada de Tancos? Ou em tantos outros sectores em que o PSD ou não se faz ouvir ou não consegue fazer-se ouvir? A degradação destes serviços (e de muitos outros) é uma continuação da austeridade que poderia ser mitigada caso fosse dividida por todos. Ao privilegiar sectores como os da Função Pública, onde se situa a grande base de apoio eleitoral dos partidos que sustentam o Governo, prejudicou todos os outros. Apesar de serem, principalmente, esses ‘todos os outros’ que têm feito, com o seu esforço, o país andar para a frente.

Como em todas as questões é possível evitar o 8 e o 80. Podem fazer-se caminhos de compromisso. Sim, pode-se querer, e bem, não recusar um Orçamento que não se conhece. Mas não se pode ficar calado ou quase em relação a coisas que conhecemos bem demais. E sobre essas, ou Rio se cala, ou a sua voz não chega.