ESTATÍSTICAS

Sim, o desemprego está a subir (mesmo que Passos não perceba porquê)

EXPLICAÇÕES Pedro Passos Coelho quer lhe expliquem por que razão o INE subiu a taxa de desemprego. A resposta é simples FOTO ANA BAIÃO

EXPLICAÇÕES Pedro Passos Coelho quer lhe expliquem por que razão o INE subiu a taxa de desemprego. A resposta é simples FOTO ANA BAIÃO

Passos Coelho não sabe porque subiu esta taxa mas o Expresso perguntou ao INE e explica. Não há volta a dar-lhe: o desemprego está mesmo a subir.

TEXTO SÓNIA M. LOURENÇO e PEDRO SANTOS GUERREIRO

Pedro Passos Coelho levantou dúvidas sobre a revisão em alta da taxa de desemprego pelo INE, mas a explicação é simples. E confirma a conclusão: há mais desempregados em Portugal, compreenda ou não o primeiro-ministro as razões para essa tendência.

O momento marcou o debate quinzenal na Assembleia da República, na quarta-feira passada, quando o primeiro-ministro foi confrontado pela oposição com os números do desemprego, divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), que apontam para uma subida da taxa de desemprego em fevereiro, pelo quarto mês consecutivo, para 14,1%. Além disso, o INE reviu em forte alta o valor da taxa de desemprego em janeiro, passando-a de 13,3%, para 13,8%.

Na resposta, Pedro Passos Coelho chutou para canto: “O Governo ainda não está em condições de formular uma explicação, porque ainda não conhecemos os fundamentos”, afirmou, classificando a revisão feita pelo INE como “sensível”. O INE, “não pode rever uma estatística destas sem apresentar um fundamento sério para essa decisão”, considerou o primeiro-ministro, reforçando que “não ouvi as fundamentações adequadas para uma revisão desta amplitude”.

O Expresso questionou o INE e analisou os destaques publicados pelo Instituto com as estatísticas mensais sobre a taxa de desemprego.

Em primeiro lugar, não houve qualquer alteração na metodologia seguida pelo INE para apurar os valores mensais. O INE começou a divulgar estatísticas mensais sobre o mercado de trabalho em novembro do ano passado (relativas a outubro) – até aí eram apenas trimestrais – e, desde então, segue a mesma metodologia. É essa metodologia que explica a necessidade de fazer revisões aos valores para o desemprego que vão sendo divulgados mensalmente. É pois aqui que residem os “fundamentos” que Pedro Passos Coelho diz “não conhecer”.

Em segundo lugar, essa metodologia não só é pública, como o INE inclui todos os meses, nos destaques publicados sobre o desemprego, notas que a explicam e detalham.

Metodologia descodificada

As estatísticas mensais de emprego e desemprego, divulgadas pelo INE não correspondem apenas a um mês, mas a trimestres móveis centrados nos meses de referência. Janeiro, por exemplo, corresponde ao mês central do trimestre que vai de dezembro a fevereiro. Mais ainda, o último valor para a taxa de desemprego, disponibilizado em cada destaque mensal, é calculado com base em informação incompleta. Isto porque resulta da média simples de três parcelas: dois meses para os quais existe informação completa, já recolhida pelo INE no âmbito do Inquérito ao Emprego, e um mês para o qual é necessário “realizar uma projecção, dada a recolha não ter sido ainda iniciada”, explica o instituto.

Como resultado, “o seu valor é provisório”, frisa o INE, esclarecendo que esse carácter é “devidamente assinalado nos destaques à comunicação social e fundamentado em diversas notas explicativas tornadas públicas”. Depois, o valor provisório “é substituído, na divulgação do mês seguinte, pelo valor definitivo, quando a recolha da informação, no âmbito do Inquérito ao Emprego, do terceiro mês que compõe o trimestre móvel, já se encontra concluída”. Há, assim, lugar a uma revisão.

Foi o que aconteceu com a taxa de desemprego de janeiro (que corresponde ao trimestre móvel centrado em janeiro e que vai de dezembro a fevereiro). No destaque publicado a 27 de fevereiro, o INE avançou um valor provisório de 13,3%. Provisório, porque foi calculado com base em informação incompleta. Havia já dados relativos a dezembro de 2014 e janeiro de 2015, mas não em relação a fevereiro de 2015. Para esse mês foi necessário o INE fazer uma projecção. Depois, no destaque seguinte, divulgado na semana passada (30 de março), a informação em falta, relativa a fevereiro, já estava disponível, e o INE publicou o valor definitivo da taxa de desemprego de janeiro, de 13,8%. Um valor revisto, que é 0,5 pontos percentuais mais alto do que o número provisório. O que leva a uma conclusão imediata: o comportamento real do mercado de trabalho português em fevereiro foi muito pior do que o INE tinha inicialmente projectado.

Revisões são a regra

Devido à aplicação da metodologia seguida pelo INE, a existência de diferenciais entre os valores provisórios (estimados inicialmente), e os valores definitivos (já revistos) é a regra e não a exceção. Basta olhar para a série dos números mensais da taxa de desemprego desde que o INE começou a divulgar esta estatística (ver gráfico).

Os valores provisórios e os valores definitivos nunca são iguais, embora, até aqui, nenhuma revisão tivesse a dimensão de janeiro. Afinal, foram mais 0,5 pontos percentuais. O INE nota, contudo, que “o nível da revisão em causa, que afeta apenas o valor de um mês, é inferior aos níveis médios que estavam a ser praticados nas estimativas anteriormente divulgadas pelo Eurostat, que afectavam também os três últimos meses”.

Além disso, a dimensão da revisão relativa a novembro de 2014 não ficou longe do que aconteceu agora com janeiro: foram 0,4 pontos percentuais. A diferença é que o valor definitivo apurado pelo INE para a taxa de desemprego foi mais baixo do que o valor provisório. Ou seja, a taxa de desemprego em novembro foi revista em baixa – e não em alta – passando de 13,9%, para 13,5%. Uma redução com base nos mesmos fundamentos que levaram à revisão em alta da taxa de desemprego em janeiro de 2015, e que o primeiro-ministro afirmou, agora, “desconhecer”.