TANCOS

O ministro que sabia de menos

Azeredo Lopes nunca soube de nada. Ouvindo as suas sucessivas declarações ao longo do último ano, conclui-se que o ministro da Defesa foi sabendo dos desenvolvimentos do assalto a Tancos ou pelos jornais ou com a mesma informação que seria noticiada nos jornais. Tancos não é um mistério, são muitos

Texto Pedro Santos Guerreiro Ilustração Tiago Pereira Santos

Quando esta quarta-feira à noite o Expresso falou com José Azeredo Lopes, surpreendeu-o com a informação: o major Vasco Brazão assegurara na terça-feira ao juiz de instrução do caso Tancos ter dado conhecimento ao ministro da Defesa, mais de um mês após a recuperação do armamento furtado em Tancos, da encenação montada na Chamusca. O ministro não quis comentar a informação relacionada com o interrogatório de Vasco Brazão, invocando o segredo de justiça. Mas respondeu com uma só palavra à pergunta sobre se foi ou não informado da operação de encobrimento: “não”.

O que soube até hoje o ministro da Defesa sobre o caso do assalto a Tancos? O primeiro-ministro tem saído sucessivamente em sua defesa, afirmando por exemplo que não é responsabilidade de nenhum membro do governo estar de guarda à porta de paióis. Esta quinta de manhã, após a publicação da notícia do Expresso, pôs um cinto de segurança político na cadeira da Azeredo Lopes, mantendo a confiança política.

“Desconheço em absoluto o que tenha sido dito por qualquer pessoa em qualquer depoimento, que aliás presumo que esteja em segredo de justiça”, afirmou António Costa ao Expresso. “Conheço o que de modo inequívoco o ministro da Defesa Nacional já declarou em público e que não suscita qualquer quebra de confiança.”

Era o segundo momento de um dia acelerado no governo, que por acaso se reunia de manhã em conselho de ministros sem a presença de Azeredo Lopes, que estava em Bruxelas. Foi de lá que pôde ler a sucessão notícias da manhã:

11h03 Expresso publica a notícia que pôs o país político em polvorosa: “Tancos: investigador da PJM garante que Azeredo Lopes soube do encobrimento. Ministro desmente”

12h26 Começam as reações políticas. O primeiro é o social-democrata que preside à comissão parlamentar de Defesa: “Marco António sobre ministro da Defesa: ‘Uma acusação destas é de uma gravidade sem precedentes’”.

12h52 Expresso publica a reação do primeiro-ministro: “Tancos: Costa segura Azeredo. ‘Não suscita qualquer quebra de confiança’”.

13h08 As reações políticas prosseguem à direita: “CDS. Comissão de inquérito deve investigar ‘quem está a mentir’ sobre Tancos”.

13h51 O ministro da Defesa fala aos jornalistas, reiterando o que dissera na véspera ao Expresso: “Azeredo Lopes: ‘É totalmente falso que eu tenha tido conhecimento de qualquer encobrimento’”.

17h59 Só a meio da tarde o Bloco de Esquerda presta declarações públicas: “Catarina Martins: ‘Ministro ganhava em prestar esclarecimentos no parlamento’”.

A toada noticiosa não ficará por aqui. Aliás, o Expresso traz esta sexta-feira, na sua edição semanal, mais informações sobre a investigação em curso. Ah: e Marcelo Rebelo de Sousa, que tão preocupado se tem mostrado desde o assalto com o caso Tancos, não tinha ainda falado ao fim da tarde - mesmo que não tenha alinhado sempre com o mesmo chavão do discurso oficial do primeiro-ministro e do ministro da Defesa, que se resume ao “à justiça o que é da justiça”.

O ministro da Defesa garante que não sabia de mais e talvez soubesse de menos em todo o processo. Afinal, o mesmo governante que desmente ter sido informado da operação de encobrimento também chegou a não saber sequer se houve assalto ou se havia armas ainda à solta. E, no entanto, elas apareceram. E só agora começa a perceber-se como. Nada nesta história é simples nem linear.

Costa segura Azeredo. “Não suscita qualquer quebra de confiança”

“Desconheço em absoluto o que tenha sido dito por qualquer pessoa em qualquer depoimento”, disse António Costa ao Expresso Foto Paulo Cunha/Lusa

Desconheço em absoluto o que tenha sido dito por qualquer pessoa em qualquer depoimento”, disse António Costa ao Expresso Foto Paulo Cunha/Lusa

Primeiro-ministro mantém, em declarações ao Expresso, a confiança política no ministro da Defesa. É a reação à notícia de que Vasco Brazão garantiu que deu posterior conhecimento a Azeredo Lopes da operação de encobrimento da recuperação das armas. Ministro desmente ter tido qualquer conhecimento

Texto Pedro Santos Guerreiro, Joana Pereira Bastos, Hugo Franco, Rui Gustavo e Micael Pereira

“Desconheço em absoluto o que tenha sido dito por qualquer pessoa em qualquer depoimento, que aliás presumo que esteja em segredo de justiça”, afirma António Costa ao Expresso. “Conheço o que de modo inequívoco o ministro da Defesa Nacional já declarou em público e que não suscita qualquer quebra de confiança”.

É a resposta do primeiro-ministro à pergunta colocada esta manhã pelo nosso jornal sobre que comentários tem a fazer e se mantém a confiança política em Azeredo Lopes depois da notícia avançada pelo Expresso, de que o major Vasco Brazão assegurou ter dado conhecimento a Azeredo Lopes da encenação montada na Chamusca mais de um mês após a recuperação do arsenal. O ministro da Defesa já negou ter tido qualquer conhecimento.

Durante o interrogatório de oito horas, realizado esta terça-feira, o major Vasco Brazão, investigador da Polícia Judiciária Militar (PJM), garantiu ao juiz de instrução que, no final do ano passado, e já depois das armas terem sido recuperadas, deu conhecimento ao ministro da Defesa, juntamente com o diretor daquela polícia, coronel Luís Vieira, da encenação montada em conjunto com a GNR de Loulé em torno da recuperação das armas furtadas nos paióis de Tancos.

Confrontado pelo Expresso, o ministro da Defesa recusou-se a comentar a informação dada por Vasco Brazão ao tribunal, invocando o segredo de justiça. Contudo, questionado pelo nosso jornal sobre se foi ou não informado da operação de encobrimento na recuperação das armas de Tancos, o ministro da Defesa respondeu categoricamente que "não". Nem antes dessa operação ter sido realizada, em outubro, nem depois dela, no final do ano de 2017.

Saiba mais informações sobre esta investigação amanhã no semanário Expresso, que esta semana é publicado sexta feira, feriado.

Azeredo Lopes: “É totalmente falso que eu tenha tido conhecimento de qualquer encobrimento”

O ministro da Defesa insistiu que “é totalmente falso que tenha tido conhecimento de qualquer encobrimento” Foto Marcos Borga

O ministro da Defesa insistiu que “é totalmente falso que tenha tido conhecimento de qualquer encobrimento” Foto Marcos Borga

O ministro da Defesa nega “de forma categórica” ter sido informado do encobrimento do roubo do material de Tancos. Azeredo Lopes diz ter tomado conhecimento do caso “como todos os portugueses”. E diz que não “fala pelo chefe de gabinete”, que ainda no ano passado deixou o cargo

Texto Susana Frexes (correspondente em Bruxelas)

O ministro da Defesa negou esta tarde que tenha sido informado da encenação montada na Chamusca, contrariando o que terá dito o major Vasco Brazão ao juiz de instrução do caso Tancos. Em Bruxelas, e à margem de uma reunião da NATO, Azeredo repetiu várias vezes que não sabia do encobrimento antes de ter sido tornado público.

"Não tive conhecimento de qualquer facto que me permitisse acreditar ter havido um qualquer encobrimento no processo dito da descoberta do material militar de Tancos", disse aos jornalistas, adiantando ter sido surpreendido "com notícias de acusações de que teria qualquer conhecimento relativamente a este ou aquele encobrimento".

Fontes do processo adiantaram ao Expresso que Vasco Brazão garantiu no tribunal ter entregue pessoalmente um memorando com a explicação de toda a operação ao chefe de gabinete de Azeredo Lopes, acrescentando que o chefe de gabinete contactou telefonicamente o ministro, à frente de Brazão e do coronel Luís Vieira.

Confrontado com este encontro, Azeredo Lopes voltou a repetir que "é totalmente falso que tenha tido conhecimento de qualquer encobrimento", mas escusa-se a falar sobre o anterior chefe de gabinete, Martins Pereira, ou sobre a entrega de um memorando.

"Não vou falar pelo meu chefe de gabinete nem desenvolver mais este tópico", disse. Em dezembro do ano passado, o major-general Martins Pereira foi promovido a tenente-general, tendo por isso de abandonar o cargo no Ministério da Defesa.

Azeredo Lopes recusa também comentar o que disse Vasco Brazão em tribunal. "Uma pessoa que tanto quanto sei nem sequer conheço", disse, referindo-se ao investigador da Polícia Judiciária Militar. "Nunca estive com ele".

O ministro, que esta manhã tinha já falado sobre o caso à imprensa, afastando qualquer intenção de se demitir por causa da polémica em torno de Tancos, voltou a convocar os jornalistas para "negar categoricamente" e "olhos nos olhos" a possibilidade de ter sido informado pelos militares da encenação da recuperação das armas, no final do ano passado.

"Eu soube deste encobrimento exatamente como todos os portugueses, ou seja, na altura em que a Polícia Judiciária tomou a iniciativa de fazer o que é do conhecimento público", responde, escusando-se a mais dar mais detalhes, invocando "matéria que está em segredo de Justiça".

Marco António sobre ministro da Defesa: “Uma acusação destas é de uma gravidade sem precedentes”

Acusação deve ser "objeto da comissão de inquérito" ao assalto a Tancos, entende o deputado e presidente da comissão parlamentar de Defesa Foto Tiago Miranda

Acusação deve ser "objeto da comissão de inquérito" ao assalto a Tancos, entende o deputado e presidente da comissão parlamentar de Defesa Foto Tiago Miranda

O social-democrata e presidente da comissão parlamentar de Defesa espera que “não passe de um mal-entendido” a notícia de que o ministro da Defesa foi informado sobre a encenação da PJM na recuperação das armas. Mas Ângelo Correia, coordenador do PSD para a área da Defesa, diz que politicamente não pode reagir com base em “suposições”

Texto Vítor Matos

É uma acusação de uma "gravidade sem precedentes". E deve ser "objeto da comissão de inquérito" ao assalto a Tancos. O PSD reage a duas vozes à notícia do Expresso de que o ministro da Defesa foi informado da operação de encenação da PJM para recuperação do material furtado em Tancos. Azeredo Lopes, porém, disse ao Expresso o ministro invocou o segredo de justiça e respondeu categoricamente que "não" foi informado.

Marco António Costa, deputado e presidente da comissão parlamentar de Defesa, diz ao Expresso, "a título pessoal" esperar "que tudo não passe de um mal entendido". Mas acrescenta um comentário político: A título institucional entendo que uma acusação destas assume uma gravidade sem precedentes".

O coordenador do PSD para a área da Defesa e membro do Conselho Estratégico Nacional tem uma posição mais defensiva. Ângelo Correia diz ao Expresso que para já é difícil avaliar a informação uma vez que é a palavra de um contra o outro: "Como é que vamos debater o tema se um diz que sim não e outro que não?". E acrescenta que "politicamente" ainda é cedo para fazer quaisquer comentários, porque "não faz sentido fazer comentários sobre suposições". Isso não invalida, porém, segundo Ângelo Correia, que o Parlamento não venha a debruçar-se o assunto: "Vai ser obviamente objeto na comissão de inquérito" que deverá arrancar na Assembleia da República ao assalto de Tancos. No entanto, o coordenador do PSD para a Defesa prefere colocar a tónica na investigação judicial: "É um facto que cabe no papel do inquérito da PGR que está a decorrer. Estou convencido que essa matéria vai ser esclarecida nesse inquérito",

O Expresso noticiou na manhã desta quinta-feira que, no final do ano passado - e já depois do material ter sido recuperado -, o major Vasco Brazão, investigador da PJM, e o diretor daquela polícia, coronel Luís Vieira, deram conhecimento ao ministro da Defesa da encenação montada em conjunto com a GNR de Loulé em torno da recuperação das armas furtadas. O oficial garantiu isso mesmo, esta terça-feira, ao juiz de instrução durante o interrogatório de oito horas no Campus da Justiça.

De acordo com fontes do processo, Vasco Brazão garantiu no tribunal ter entregue pessoalmente, no final do ano, um memorando com a explicação de toda a operação ao chefe de gabinete de Azeredo Lopes, acrescentando que o chefe de gabinete contactou telefonicamente o ministro, à frente dos dois militares da PJM, para o informar da situação.

Confrontado pelo Expresso, o ministro da Defesa recusou-se a comentar ao Expresso a informação dada por Vasco Brazão ao tribunal, invocando o segredo de justiça. Contudo, questionado sobre se foi ou não informado, o ministro da Defesa respondeu categoricamente que "não". Nem antes dessa operação ter sido realizada, em outubro, nem depois dela, no final do ano de 2017.