BRASIL

O Lava Jato atingiu Lula mas as ondas de choque podem chegar a Dilma

SUSPEITO O ex-Presidente Lula da Silva foi ouvido durante três horas no âmbito do Processo Lava Jato FOTO RICARDO MORAES / REUTERS

SUSPEITO O ex-Presidente Lula da Silva foi ouvido durante três horas no âmbito do Processo Lava Jato FOTO RICARDO MORAES / REUTERS

Os fortes indícios de que o ex-Presidente brasileiro Lula da Silva recebeu dinheiro desviado da Petrobras motivaram a sua detenção, esta sexta-feira. O caso Lava Jato ameaça agora os alicerces do Partido dos Trabalhadores (de Lula e da Presidente Dilma Rousseff), que se vê a braços com o envolvimento de um dos seus maiores símbolos no maior escândalo de corrupção do país

TEXTO CRISTINA POMBO

Às primeiras horas da manhã de sexta-feira arrancava a 24ª. Operação Lava Jato, o escândalo relacionado com a gigante petrolífera brasileira Petrobras que rebentou há precisamente dois anos.

Confirmavam-se, assim, os receios dos partidários do PT (partido do poder no Brasil e do qual Lula foi membro fundador), com o foco da investigação a voltar-se para o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O ex-Presidente foi esta sexta-feira alvo de um mandado de busca e apreensão e de condução coerciva (o que acontece quando a pessoa investigada é obrigada a prestar depoimentos), escrevem os jornais brasileiros.

Foram efetuadas buscas na sua casa, logo ao início da manhã, e o mesmo aconteceu na casa do filho, conhecido por Lulinha, e no Instituto do ex-Presidente. Os seus familiares também constam da lista de pessoas sob investigação nesta etapa da Operação Lava Jato, denominada Aletheia, palavra grega para verdade. A mulher, Marisa, os três filhos e uma nora do ex-Presidente estão a ser investigados.

Dinheiro da Petrobras nas mãos de Lula

Durante a manhã desta sexta-feira, o Ministério Público federal emitiu um comunicado em que acusa o ex-Presidente de ter sido “um dos principais beneficiários” de crimes cometidos no âmbito da Petrobras. No documento são apontadas, com detalhe, indícios de que o ex-Presidente recebeu valores relacionados com o esquema de corrupção da empresa estatal Petrobras através de obras num apartamento triplex em Guarujá e em Atibaia (ambos no estado de São Paulo).

De acordo com a imprensa brasileira, estão ainda a ser averiguadas doações no valor de 20 milhões de reais (€4,7 milhões) ao Instituto Lula, e o pagamento de palestras à LILS Palestras no valor de 10 milhões de reais (€2,4 milhões).

BUSCAS Polícia brasileiro vigia a entrada do Instituto Lula, em São Paulo FOTO LEO BARRILARI / EPA

BUSCAS Polícia brasileiro vigia a entrada do Instituto Lula, em São Paulo FOTO LEO BARRILARI / EPA

Em agosto de 2015, a revista brasileira “Veja” denunciava que a LILS, empresa de palestras do ex-Presidente, tinha obtido estas receitas de construtoras investigadas no escândalo da Petrobras. Na altura, a assessoria do Instituto negou quaisquer ilegalidades nas palestras dadas por Lula em “dezenas de empresas de diferentes setores e países”.

A mesma nota do MP brasileiro diz que ao longo das 23 fases do processo Lava Jato, “avolumaram-se indícios” de enriquecimento de funcionários da Petrobras, operadores e partidos políticos. O comunicado acrescenta que os factos são da competência federal porque ocorreram igualmente quando Lula esteve na Presidência: “Possivelmente, a sua influência foi usada, antes e depois do mandato − o que é objeto de investigação −, para que o esquema existisse e se perpetuasse”.

A super operação, realizada no Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia, e que envolveu 200 polícias federais e 30 auditores fiscais, investiga crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito do caso que envolve a empresa petrolífera do Estado Petrobras.

Segundo a “Folha de São Paulo”, que citou elementos da defesa do ex-Presidente, Lula da Silva foi levado pouco depois das 8h50 locais (perto das 6h em Portugal) para o aeroporto de Congonhas, onde esteve cerca de três horas a prestar depoimentos à Polícia Federal brasileira. O aeroporto terá sido o local escolhido para o interrogatório por razões de segurança.

“Prego no caixão do PT e do Governo”

“Politicamente, é um prego no caixão cada vez mais fundo na terra do PT e do Governo”, escreveu Igor Gielow, diretor da sucursal de Brasília da “Folha”, pouco depois de se saber que Lula tinha sido detido para prestar declarações.

A detenção do ex-dirigente, escreve a imprensa brasileira, acontece um dia depois de ter sido revelado um acordo de delação premiada (um benefício legal concedido a um réu que aceite colaborar numa investigação) do senador Delcídio do Amaral. O parlamentar terá revelado que Lula mandou comprar o silêncio de testemunhas, segundo confirmaram à “Folha de São Paulo” pessoas próximas do processo Lava Jato. Delcídio também acusou a atual Presidente, Dilma Rousseff, de ter interferido na Operação Lava Jato, para tentar libertar réus presos durante o processo.

Foram quase imediatas as reações do Palácio do Planalto aos acontecimentos das últimas horas. Fontes próximas da Presidência garantiram à “Folha” que acreditam ter-se tratado de uma ação combinada para enfraquecer a Presidente Dilma, Lula e o próprio Governo.

No partido de Lula e Dilma avolumam-se os receios, que levaram de imediato parlamentares, governadores e outros elementos do PT de todo o país a São Paulo, onde o partido organizará uma reunião geral para traçar uma estratégia de reação à operação.

Entretanto, vários manifestantes contra e a favor de Lula, que começaram a concentrar-se a meio da manhã (hora local, tarde em Portugal continental) junto à casa do ex-Presidente em São Bernardo do Campo, São Paulo, envolveram-se em confrontos, obrigando à intervenção da polícia de choque. As autoridades também foram forçadas a intervir para controlar uma multidão de apoiantes e críticos do homem forte do PT que estiveram no aeroporto de Congonhas, onde Lula foi interrogado.