Henrique Raposo

A tempo e a desmodo

Henrique Raposo

O zepelin de Le Pen (e do Bloco)

Contactos do autor

Há uma coisa certa sobre Zepelins: explodem sempre

Há uma coisa certa sobre Zepelins: explodem sempre

O facebook não é progenitor do radicalismo à Le Pen e à BE só por causa do algoritmo que funciona como funil mental. O perfil financeiro do facebook também não ajuda. Apesar de ter uma (incompreensível) boa imprensa, a empresa de Zuckerberg não é diferente dos fundos financeiros como o Lone Star (dono do Novo Banco), que são sempre embrulhados num manto negro. É sempre assim: as empresas 2.0 (Facebook, Google, Amazon) são tratadas como princesas imaculadas que vivem numa Camelot maravilhosa chamada “nuvem”, enquanto as empresas e bancos do velho mundo analógico são encarados como vilões que vivem numa distopia chamada “capitalismo predatório”, “capitalismo apátrida” ou “capitalismo de casino”. Sucede que o facebook pode ser tão predatório, injusto e apátrida como o Lone Star. Ainda há dias a revista do Expresso reportou uma situação sinistra que explica o porquê da revolta nacionalista à Le Pen, à Brexit e à BE contra o status quo: no País de Gales, o Facebook paga menos impostos do que uma simples pasteleira de uma simples pastelaria.

Há a sensação crescente de que este (BES/Novo Banco/Lone Star) e outros negócios são feitos lá em cima, nos zepelins que não tocam no chão, que não têm os mesmos deveres que o comum dos mortais

Vale a pena recordar essa história. Em Crickhowell, os comerciantes organizaram uma campanha contra as offshores e contra a evasão fiscal das multinacionais, porque descobriram que uma simples funcionária de uma padaria paga mais impostos do que o Facebook. Este é um absurdo imoral que chega a ser cómico: através da falta de transparência antiliberal deste capitalismo (o labirinto das offshores e das regras fiscais), o facebook consegue pagar menos impostos do que uma padeira ou pasteleira. E este é apenas um dos muitos exemplos da pornografia fiscal permitida por este capitalismo que nunca toca no chão, que nunca toca nas realidades nacionais; é como se os offshores funcionassem como uma rede de zepelins que nunca aterra na realidade. Uma coisa é a livre circulação do capital entre países, outra coisa é a impunidade do capital. Uma coisa é o zepelin sair de um país e aterrar noutro; outra coisa é nunca aterrar, nunca passando por qualquer alfândega terrestre ou terráquea.

Se o centro político não reagir a estes excessos, a população continuará a fazer o seu caminho em direção aos nacionalismos antiglobalização. Porque há a sensação crescente de que estes zepelins são entidades impunes. Isso vê-se nesta questão do BES/Novo Banco, Lone Star e estado português. Há a sensação crescente de que este e outros negócios são feitos lá em cima, nos zepelins que não tocam no chão, que não têm os mesmos deveres que o comum dos mortais; há a sensação crescente de que as pessoas comuns estão presas numa tenaz composta pelo Estado e pelas grandes multinacionais. E, acima de tudo, há a sensação de que esta tenaz opera a uma altura estratosférica e com uma linguagem técnica e obscura. Le Pen, Tsipras, PCP e Bloco prosperam nesta opacidade.