DEBATE QUINZENAL | PASSES SOCIAIS

PSD sem resposta à “bomba” do Governo. Esquerda capitaliza e tenta colher créditos

<span class="creditofoto">Foto António Cotrim / Lusa</span>

Foto António Cotrim / Lusa

Fernando Negrão tentou provar a tese da injustiça territorial da redução dos passes sociais, mas acabou a falar da “bancarrota” de José Sócrates. CDS não explorou o tema, e a esquerda juntou-se à volta do Governo

Texto Mariana Lima Cunha e Miguel Santos Carrapatoso

Foi um debate quinzenal morno, mesmo para os critérios de uma legislatura que se arrasta a passos largos para o fim. Temas repescados, argumentos e contra-argumentos repetidos de forma quase automática e uns quantos chavões de parte a parte. António Costa levou para o Parlamento os feitos da economia portuguesa e quis deixar uma promessa: “Portugal vai continuar a crescer e a crescer acima da média europeia”. Perspetivava-se uma tarde tranquila para Costa, ainda para mais depois de a agência de notação financeira Standard & Poor ter subido o rating da dívida portuguesa.

Os sociais-democratas não estavam interessados em correr nessa pista. Quiseram desde cedo desarmadilhar a “bomba eleitoral” lançada pelo Governo nos transportes públicos, cujo impacto pode vir a ser superior ao aumento do salário mínimo nacional, e denunciar o “eleitoralismo” e a “injustiça” territorial da medida da redução dos passes sociais, particularmente sentida nas áreas metropolitana de Lisboa e do Porto. “O que tem a dizer aos portugueses que pagam o passe único sem direito a nada?”, criticou Fernando Negrão, líder parlamentar do PSD, repetindo o mesmo argumento já usado no Twitter por Rui Rio.

Mas António Costa tinha a resposta estudada. “É errada a ideia de que só se vai aplicar nas áreas metropolitanas. Aplica-se em todos os municípios que quiseram aderir”, garantiu o primeiro-ministro, lembrando que todas as 23 Comunidades Intermunicipais (CIM) negociaram as suas propostas e que os novos passes vão entrar em vigor já em abril em 18 delas. A partir daí, Negrão disparou em todas as direções possíveis: não há transportes para todos, isto é só para alguns, os preços dos combustíveis aumentaram… O líder socialista respondeu com um facto: este Governo reduziu os preços dos transportes públicos, o anterior não. Negrão ainda lançou a carta da “bancarrota” herdada de Sócrates, mas o tema estava resolvido. Prova disso é que nem Assunção Cristas usou a redução dos passes sociais para tentar fragilizar o Governo. E o PSD ficou isolado.

Foto António Cotrim / Lusa

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À esquerda todos querem assumir a paternidade

No que tocou à questão dos passes, a esquerda apresentou-se como uma verdadeira frente unida - o elogio da medida interessava a todos os partidos, uma vez que todos dizem ter direito a recolher louros por ela. Embora a iniciativa tenha sido sempre associada ao Governo, depois de ter sido anunciada por Fernando Medina, tanto Bloco de Esquerda como PCP esforçaram-se por espetar as respetivas bandeiras numa medida que é vista, para o bem e para o mal, como a grande “bomba” eleitoral do ano e até da legislatura. Mesmo com objetivos próprios, uniram-se e para isso encontraram um alvo comum a abater: a direita.

Catarina Martins começou a sua intervenção precisamente por fazer uma espécie de defesa do Governo, uma vez que aproveitou para responder às críticas que Fernando Negrão dirigira não ao Bloco mas ao Executivo: “Eleitoralismo é fazer um simulador para a devolução de uma sobretaxa que nunca aconteceu”, disparou, criticando ainda as tentativas de privatização das empresas de transportes. Em resumo, a medida não só é um “orgulho” para os bloquistas como é também “típica desta solução política”, dado que devolve rendimentos e opta por desenvolver os transportes coletivos. Mas a coordenadora bloquista quis também lembrar a proposta própria do BE para que os movimentos entre áreas metropolitanas e comunidades intermunicipais diferentes sejam também abrangidos pelos descontos.

Foto António Cotrim / Lusa

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No PCP, a mesma lógica: a iniciativa é boa, mostra um “verdadeiro incentivo ao transporte público” e tem “enorme alcance social” - mas os comunistas reclamam a “paternidade” de alguns dos seus melhores aspetos. O partido, que nas ruas já espalhou cartazes a lembrar que sem a sua ação esta medida não existiria, fez questão de salientar que o Governo acabou mesmo por aumentar a dotação de 83 para 104 milhões de euros, como o PCP propôs em sede de Orçamento do Estado.

Mesmo com exigências da esquerda para a melhoria das condições da rede de transportes públicos, o discurso da esquerda estava estabelecido e em sintonia. Por isso, Costa rematou, em resposta a Heloísa Apolónia, do PEV, com o ponto que poria todos de acordo: “Foi constrangedora a intervenção do PSD. Não quer admitir que votou contra a existência dos passes sociais e esta redução do seu tarifário”. A esquerda anuiu - e ficou para a fotografia.