Ensino superior
CDS quer concursos entre estrangeiros e portugueses que não conseguem vaga na universidade pública. Quem não tem dinheiro, só com empréstimos
© Expresso Impresa Publishing S.A.
Ensino superior
CDS quer concursos entre estrangeiros e portugueses que não conseguem vaga na universidade pública. Quem não tem dinheiro, só com empréstimos
A semana ficou marcada por uma proposta polémica do CDS: o partido quer que os alunos sem vaga na universidade pública possam pagar o custo total do curso e entrar, como acontece com os estrangeiros de fora da UE. A crítica foi imediata e comum a vários setores: tudo não passaria de uma forma de beneficiar os mais ricos, desprezando assim a meritocracia - uma bandeira do partido. Em entrevista ao Expresso, Mariana França Gouveia, membro da equipa que está a preparar o programa do CDS e diretora da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, dá novas explicações
Texto Mariana Lima Cunha
Mariana França Gouveia diz que a ideia é pôr “qualquer aluno português”, e não apenas os que tiveram boas médias mas ficaram à porta da universidade, a competir com os estrangeiros num concurso paralelo em que serão tidas em conta as médias de cada um. Fica por explicar o que acontece a quem tem notas iguais ou superiores mas não tem dinheiro para pagar o curso.
Imaginemos que um aluno tem uma média de onze valores. Se se dispuser a pagar o preço de custo do curso que quer frequentar, pode fazê-lo?
Só se for o melhor dos alunos a concorrer para essa vaga. É relevante dizer que o numerus clausus, por ser determinado essencialmente por critérios financeiros, deixa muitos bons alunos de fora. O que esta proposta pretende é que os alunos portugueses possam concorrer em pé de igualdade às vagas que atualmente estão exclusivamente destinadas a estrangeiros. Essas condições de igualdade, que devem evidentemente presumir as notas que o aluno teve no Concurso Nacional de Acesso (CNA), devem ser objeto de acordo entre o Estado o CRUP e o CSISP.
Qual será o número de vagas a abrir para alunos portugueses?
Importa começar por esclarecer que o numero clausus não corresponde ao número desejável de alunos ou ao número de alunos com mérito. Corresponde ao número de alunos que o Estado decide financiar. Muitos ficam de fora, não porque não tenham mérito, mas porque o Estado decide não pagar mais vagas.
Ora, há muito que estudantes estrangeiros (fora da EU) podem entrar nas universidades públicas, pagando o seu curso, e ocupando as vagas que não estão financiadas pelo Estado (não nos referimos aos contingentes previstos na lei, mas à entrada de alunos em regime aberto).
Esta circunstância é talvez desconhecida de muita gente, mas é crescente: as universidades públicas aceitam alunos estrangeiros nas vagas que o Estado não paga (e que não são ilimitadas, são em número limitado).
Sucede que os estudantes portugueses estão impedidos de concorrer a essas vagas, mesmo que o queiram, mesmo que tenham boas notas, é apenas porque o Estado não lhes financia as vagas. Não há qualquer razão para esta discriminação. O que esta proposta pretende é que alunos portugueses possam concorrer com os alunos estrangeiros para essas vagas, exatamente nas mesmas condições que estes – em pé de igualdade. Esta matéria deve ser objeto de acordo com o CRUP e o CSISP.
Suponhamos que o primeiro aluno que não conseguiu nota para entrar na universidade não pode pagar esse preço, mas o segundo sim. Como é que a questão da seriação funciona?
Se a uma instituição de ensino superior pública abrir essa vaga a estrangeiros, qualquer aluno português que concorreu no CNA deve ter possibilidade de concorrer em pé de igualdade. Nessas condições de igualdade devem, evidentemente, ter-se em conta as notas dos alunos em causa, e ser atribuída [a vaga] ao melhor aluno que a ela concorre.
Nestas condições, como é que se garante que o mérito dos estudantes é valorizado e que a questão da meritocracia, bandeira do CDS, é salvaguardada?
Existindo vaga, os alunos devem concorrer em pé de igualdade. Quem tiver os melhores resultados deve entrar.
Se está previsto que haja apoios sociais também para estas famílias, como é que é possível garantir que esta medida não terá impacto orçamental?
Esta medida quer colocar os alunos estrangeiros e nacionais em pé de igualdade. Devem aplicar-se as mesmas regras. O CDS defende no seu programa um reforço do sistema de empréstimos de garantia mútua, com condições de reembolso indexadas à empregabilidade.
Esta medida poderá aplicar-se a qualquer curso?
Propomos que esta medida não se aplique aos cursos com mestrado integrado, tendo em conta as suas especificidades, de acordo com a revisão feita para o ano letivo de 2020/2021. Esta matéria deve ser objeto de negociação com o CRUP e o CSISP.
Faz sentido aplicá-la a cursos com baixa empregabilidade, uma vez que esse é um dos critérios utilizados para definir o numerus clausus?
Não é verdade que esse numerus clausus seja definido apenas com base nesse critério. São vários os critérios, e o mais determinante é financeiro. Por outro lado, essa pergunta parece presumir que o Estado não deve abrir cursos tendo em conta critérios de empregabilidade, o que não é o nosso ponto de vista. Se o curso tem procura, não há razão para limitar. Não devemos fechar um curso de filosofia mesmo se os seus níveis de empregabilidade forem inferiores a outros.
A semana ficou marcada por uma proposta polémica do CDS: o partido quer que os alunos sem vaga na universidade pública possam pagar o custo total do curso e entrar, como acontece com os estrangeiros de fora da UE. A crítica foi imediata e comum a vários setores: tudo não passaria de uma forma de beneficiar os mais ricos, desprezando assim a meritocracia - uma bandeira do partido. Em entrevista ao Expresso, Mariana França Gouveia, membro da equipa que está a preparar o programa do CDS e diretora da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, dá novas explicações