Ricardo Costa

Opinião

Ricardo Costa

Graça Fonseca e a notícia que já não devia ser notícia

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A secretária de Estado Graça Fonseca aproveitou uma entrevista de vida ao Diário de Notícias para assumir a sua homossexualidade. A conversa, conduzida pela Fernanda Câncio, merece ser lida com atenção, nomeadamente as passagens sobre aquilo que podia ser estritamente da sua privada, mas que é aqui divulgado como “afirmação política”.

A expressão “afirmação política” podia apenas ser um jogo de palavras - e as declarações de Graça Fonseca estavam obviamente pensadas e medidas -, mas a posição vai bem além disso. Ao transformar um assunto privado numa declaração política, a secretária de Estado está, não só a marcar uma posição como primeiro governante a assumir publicamente a homossexualidade como, em simultâneo, a manifestar-se contra a evidência de a orientação sexual ainda ser, muitas vezes, escondida e motivo de discriminação.

Graça Fonseca sabe, até por ser governante, que o mundo não se muda apenas com leis. E acha que é importante que pessoas com responsabilidades públicas divulguem a sua homossexualidade porque isso muda tudo muito mais depressa do que qualquer lei e, sobretudo, porque dá rosto e nome ao que muitos discutem em abstrato. Não incita ninguém a fazê-lo nem critica quem não o faz, apenas justifica de forma incrivelmente racional a sua posição.

Acompanho a carreira política de Graça Fonseca há alguns anos, primeiro na Câmara de Lisboa e agora no governo. Não tenho qualquer problema - pelo contrário, num texto destes devo fazê-lo - em dizer que é uma pessoa de quem gosto e uma política que admiro. A sua entrevista foi notícia exatamente porque já não devia ser notícia. Chegaremos ao dia em que não discutiremos estas questões e em que a sexualidade de um governante não será tema de discussão alguma. Mas sem esta entrevista estaríamos mais longe desse dia.