JOGOS OLÍMPICOS | JUDO
2,04 metros de altura, 139 quilos de peso: o judoca que quer ser lembrado como Pelé
JUDO Teddy Riner tornou-se uma lenda do tatami e hoje deve conquistar mais uma medalha de ouro para a França BENOIT TESSIER/REUTERS
Uma sombra negra do tatami mundial que não perde há mais de 100 lutas seguidas, o judoca francês Teddy Riner está no Rio de Janeiro para reinar. O que o poderá afastar da medalha de ouro é a pergunta a que ninguém conseguiu ainda responder
TEXTO CHRISTIANA MARTINS
Titã com nome de ursinho de peluche. Samurai de ébano ternurento com os bebés. Um homem curioso, mas um atleta entediante. Quando Teddy Riner entra no tatami, as dúvidas dissipam-se: ganha sempre. E esta noite aguarda-se mais uma vitória para a legenda francesa do judo na categoria dos gigantes de mais de 100 quilos.
Teddy começou de baixo. Nos seus primeiros Jogos Olímpicos, em Pequim, ganhou apenas uma medalha de bronze. Tinha 19 anos. Da segunda vez, em Londres, ganhou o ouro. Campeonatos mundiais, acumula oito títulos, com uma medalha de prata em Tóquio (2010) a incomodar o palmarés. Ah, sem esquecer os quatro campeonatos europeus. Portanto, história Riner já fez, agora é continuar a somar conquistas, bater recordes, tornar-se lenda ainda maior. E se confirmar o ouro no Rio de Janeiro, igualará o feito de outro enorme francês, David Douillet, judoca peso pesado que acumulou um bronze em Barcelona e duas medalhas de ouro, em Barcelona e Atlanta.
FOTO BENOIT TESSIER / REUTERS
Este homem enorme nasceu na ilha de Guadalupe, mas cresceu em Paris, onde andou indeciso entre o futebol e o basquete até aos 16 anos, quando escolheu o judo como o seu desporto de eleição. Feita a opção fundamental, foi um não parar mais de caminhar em direção ao pódio. Desde 2010 que Teddy Riner não perde uma única luta, qualquer coisa como 102 vitórias seguidas, metade das quais por ippon (o golpe perfeito do judo).
Mas qual será o segredo deste sucesso, quase inquestionável? A agilidade com que um homem daquela dimensão consegue mover-se sobre o tatami. E para que se perceba melhor do que se fala quando se evoca a dimensão de Riner, falamos de um atleta de 2,04 metros de altura e 139 quilos de peso, dos quais apenas cerca de 5% são gordura. E há que ter em conta que, aos 27 anos, Teddy está apenas a meio da sua carreira. Ou seja, segundo os especialistas em judo, se continuar motivado poderá apresentar-se em pelo menos mais dois Jogos.
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Ele é carioca, basta o jeitinho dele...
O Rio de Janeiro tem-lhe sido uma Cidade Maravilhosa. Nas duas vezes em que esteve na cidade para os mundiais de judo de 2007 e 2013, Riner foi sempre o número um. Ou seja, o seu primeiro título mundial foi em solo carioca, na altura com apenas 18 anos, tornando-se então o mais jovem campeão na categoria de pesos-pesados. “O Brasil e o Rio são muito especiais para mim”, afirmou Riner ao jornal “O Estado de S.Paulo”.
Também já são habituais as vitórias do francês sobre o seu adversário brasileiro Rafael Silva, o Baby. Das oito vezes que o derrotou, acabou sempre por elogiar o desempenho do judoca brasileiro. “O Rafael é muito grande, forte, pode até parecer fácil para quem está de fora, mas é muito difícil ganhar-lhe. Ele é um grande adversário”, afirmou Riner em 2013, ao conquistar o seu hexacampeonato mundial de judo, também no Rio de Janeiro. E quando a torcida, que começara por vaiar a vitória do francês, emendou a mão e passou a aplaudi-lo, Teddy levantou Rafael do tatami e ergueu o braço do brasileiro em retribuição das palmas do público.
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A última vitória de Rinner sobre Rafael Silva foi esta sexta-feira, nos quartos de final dos Jogos do Rio. No seu caminho até à medalha de ouro (a final é na noite desta sexta-feira), estão ainda um israelita e um japonês. Nada que parece capaz de o assustar.
Várias vezes no Rio de Janeiro para combater, Teddy aproveitou uma das suas viagens para visitar a favela da Rocinha e o Instituto Reação, onde se formou Rafaela Silva, a judoca brasileira que esta semana conquistou a medalha de ouro na categoria feminina de menos de 57 quilos. E, então, não perdeu a oportunidade de comentar: “O Rio é mágico para mim, foi aqui que tudo começou”.
Desta vez, a magia começou logo na cerimónia de abertura dos Jogos, quando Teddy entrou no Maracanã empunhando a bandeira francesa. “É um grande orgulho e também uma grande responsabilidade. Estou ansioso para começar esta festa”, disse à chegada ao aeroporto do Rio há uma semana.
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Teddy-bear, Teddy-Rinner
Nas entrevistas, o judoca não esconde que a família é o seu eixo fundamental. “Se cheguei onde cheguei, foi graças à minha família. Foram eles que me apoiaram e me trouxeram até aqui. Tive a sorte em ter tido uma boa educação, sempre puxaram por mim e me deram bons conselhos. Nunca me pediram para ganhar medalhas, mas sim para desfrutar”, afirmou no documentário “Na sombra de Teddy Riner”, realizado por Yann L'Hénoret, estreado no Festival de Cannes.
Pai de um pequeno rapazito chamado Eden, com dois anos, Riner derrete-se com as crianças. Especialmente a sua. “Ele é um papá maravilhoso, que cresce ao mesmo tempo que o filho”, avançou certa vez a sua mulher, Luthna Plocus, a uma revista francesa.
Uma verdadeira celebridade, Riner é uma personalidade habitual dos programas de televisão: encontra-se com políticos, trabalha como modelo em anúncios de roupas, automóveis ou perfumes. E, apesar de já ter sido operado ao ombro e ao cotovelo, é possível ir antecipando qual será a reação do público japonês a uma vitória de Teddy Riner nos Jogos Olímpicos de Tóquio em 2020.
É que sendo criadores da arte marcial, os nipónicos não lidam nada bem com a derrota na principal categoria do judo. E depois de ter pensado pendurar o quimono após os Jogos do Rio, Teddy Riner voltou atrás: “Quero somar o maior número de vitórias, quebrar todos os recordes, ganhar todos os títulos e medalhas possíveis para ser lembrado como Pelé no futebol e Michael Jordan no basquete”.